O contrato de conta corrente –
que permite a empresas de um mesmo grupo repassar o dinheiro disponível em
caixa de uma para outra que esteja com saldo negativo – não é empréstimo,
segundo decisão do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Portanto,
não há incidência do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) nesse tipo de
transação.
Essa é a primeira vez que o
conselho julga o tema de forma favorável ao contribuinte. A Procuradoria-Geral
da Fazenda Nacional (PGFN) informou que já recorreu da decisão.
O entendimento livrou a indústria
de embalagens Multicorp de uma autuação fiscal por não ter recolhido o imposto
em operações entre empresas do grupo. Ela firmou o contrato de conta corrente
com a Olvebra, fabricante de alimentos do Rio Grande do Sul. A decisão poderá
ser usada por companhias que discutem a questão no Carf.
“É um precedente, de certa forma,
surpreendente, pois os contratos ou operações conta corrente são muito comuns
entre as empresas [do mesmo grupo], principalmente multinacionais”, afirma o
advogado Fábio Fernandes, do escritório De Vivo, Whitaker e Castro Advogados. A
operação é realizada entre companhias no país ou entre uma brasileira e empresa
localizada no exterior.
A economia, com o afastamento do
IOF, pode variar se a operação for interna, ou se envolver vinculadas no
exterior. “Depende também do período do contrato, mas pode chegar a 6% do valor
do principal em um ano”, calcula o advogado. De acordo com o Decreto nº 6.306,
de 2007, que regulamenta a Lei do IOF, incide a alíquota de 0,0041% ao dia
sobre o valor emprestado (mútuo), além de 0,38% de alíquota adicional sobre o
somatório mensal dos acréscimos diários dos saldos devedores.
Para Fernandes, o efeito de uma
decisão final do Carf pode ainda ser retroativo. “Caso a decisão administrativa
venha a ser confirmada [pela Câmara Superior do Carf], os contribuintes poderão
deixar de pagar o IOF e solicitar os montantes recolhidos anteriormente”, diz.
“Diferentemente do que
interpretou a fiscalização, não houve a contratação de mútuo entre a recorrente
e sua controladora, da qual é controlada, mas sim entendo ser contrato de conta
corrente pelo qual a holding administra o caixa do grupo”, afirma na decisão o
conselheiro Luiz Roberto Domingo, da 1ª Turma da 1ª Câmara do Carf. “O direito
civil tem previsão para as duas modalidades de contrato e não cabe ao Fisco
decidir qual deles está sendo implementado no caso em apreço.” Seu voto foi
seguido pela maioria.
A PGFN recorreu para que a Câmara
Superior de Recursos Fiscais (CSRF) unifique o entendimento do órgão sobre o
tema. “O IOF não incide sobre o contrato de mútuo, mas sobre a operação
econômica de mútuo. Entendemos que a conta corrente é uma espécie de operação
de mútuo”, diz Riscado. A Lei nº 9.779, de 1999, estabelece que há a incidência
do IOF sobre mútuo.
O procurador afirma que, se uma
operação gera a possibilidade de uma empresa ficar com o recurso de outra,
ainda que do mesmo grupo econômico, “não interessa o nome do contrato, incide
IOF”.
Para o tributarista Vinicius
Branco, do Levy & Salomão Advogados, a Receita Federal só pode autuar se
evidenciar que a transferência de recursos ocorreu apenas com propósito fiscal.
“A holding não serve apenas para uma empresa participar do capital de outra
sociedade, mas também suprir os recursos necessários para que controladas e
coligadas possam sobreviver”, diz. Esse tipo de operação acontece porque a
holding tem maior poder de barganha na negociação de um empréstimo, por
exemplo.
Para o advogado, a mesma decisão
pode ser usada como precedente nas discussões de empresas que tomam empréstimo
e repassam para a controlada sem cobrar juros. “O Fisco diz que esses juros não
são dedutíveis da base de cálculo do IR”, afirma.
A discussão sobre o IOF já chegou
ao Supremo Tribunal Federal(STF), porém o processo está parado
desde 2008. “Por isso, antes recomendávamos recolher o IOF. Mas com a decisão
do Carf é possível deixar de pagar”, afirma a advogada Livia De Carli Germano,
do Lobo & de Rizzo Advogados.
Fonte: Valor Econômico.